sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Um dia destes...

Um dia destes à noite dei por mim a reler este blog. Com os posts, revivi peripécias da minha vida pessoal, relembrei pessoas, lugares, um sem número de emoções avassalaram o meu ego.
Relembrei uma crónica de um escritor que admiro, quando por momentos parei no tempo e olhei pela janela do meu quarto, o lugar onde deveriam estar as luzes da cidade tinha sido substituído por um homem com barba por fazer, ar pensativo e um olhar no infinito. O que iria naquela cabeça? Sinceramente não me preocupei de todo em tentar perceber. Notava apenas que se sentia só. Não sei se algum dia o voltarei a ver. Não o tentei procurar do outro lado do vidro, apenas me limitei a ... observá-lo!
Não serei eu certamente que julgarei este blog, alguém que o faça por mim, apenas não me sinto nem capaz, nem tampoco me é reservado o direito de o fazer. Contudo há uma coisa que não deixou de me surpreender, a quantidade de linhas que se acumulam em cada “crónica” que por aqui se escreve. Lembrei-me tantas vezes do terror que sentia nos meus tempos da escola primária quando a professora entrava na aula e nos dava a tenebrosa notícia de que iria haver composição naquele dia sobre um qualquer tema. Que tormentos que eu passava! Lembro-me tão bem, eu que nunca conseguia escrever mais do que dez linhas no máximo, e para lá chegar, a ginástica mental que tinha de fazer, o quanto tinha de arrastar a letra, que diga-se de passagem, ainda hoje é horrível, para ocupar mais espaço no papel. Talvez devesse ter passado mais tempo com os modorros e entediantes “cadernos de duas linhas”. Tantas e tantas vezes levei umas chapadas de uma outra professora, a Professora Alice, que por sinal nem era a minha, quando entrava na sala tinha obrigatoriamente de passar por mim para ir ter com a colega. Eu que estava logo na linha da frente. Sempre que a via entrar, era-me certo o meu destino num muito curto espaço de tempo. Quando batiam à porta e eu vislumbrava através do vidro fosco uma figura de estatura baixa, curvada pelo peso da idade e sempre vestida de preto, presumo que se tratasse de um luto, nunca o soube ao certo, sentia as pernas a tremer. Era bastante previsível o que me esperava! Hoje relembro a situação com humor, na altura não conseguia discernir muita graça na atitude.
Lembro esses dias de composição, quando a minha mãe chegava a casa e me perguntava o que tinha feito na escola, ao que eu respondia cabisbaixo.
- Hoje fizemos uma composição.
- Pronto já tiveste o dia estragado.
Qualquer coisa deste tipo me dizia na altura a minha mãe. Sorrio enquanto escrevo estas linhas...
Eu que não falhava uma conta de somar, subtrair, dividir ou multiplicar na Matemática. Mais tarde já no ciclo preparatório não falhava uma reacção química, um problema de Física, então a Biologia nem se fala, quase não a estudava.
Mais tarde apareceram a História e a posteriori a Filosofia, outros tormentos. Disciplinas onde, da mesma forma tinha de compor textos com mais de dez linhas. Parecia que as composições me perseguiam, que me atormentavam tiranicamente!
Hoje continuo sem falhar muito nas contas de Matemática, nas reacções de Química Orgânica, bem mais complexas, nas Biologias, nas Anatomias, etc e quando olho para este blog vejo que já consigo escrever mais do que dez linhas.
A minha letra, essa continua intragável, nem as palmadas da Professora Alice serviram para a corrigir, ou pelo menos melhorar, devo dizer até que com o Tempo parece-me que se vai deteriorando, mas isso é o que o Tempo faz a tudo, acaba por deteriorar tudo no mundo.
Não sou mais um miúdo sem barba, hoje sou um homem com barba por fazer, ar pensativo e um olhar no infinito que substitui as luzes da cidade na janela do meu quarto. Que consegue escrever mais do que dez linhas!